A HORA | CIDADES | PÁGINA 8
No Vale, oito servidores são responsáveis por verificar mais de 60 empresas
A defasagem de fiscais agropecuários federais que atuam em aeroportos, portos, indústrias e fronteiras põe em risco a qualidade dos produtos exportados, como os derivados de leite. Problemas de corrupção também preocupam empresários e consumidores.
No Vale do Taquari, aproximadamente 60 empresas são fiscalizadas pelos servidores na produção de leite, ovos, suínos, aves e bovinos. Entre 2013 e 2015, o quadro de fiscais caiu de 17 para oito. Esses são responsáveis por fiscalizar o abate de 800 mil frangos por dia, seis mil suínos, além da produção leiteira e fabricação de ração produzida para esses animais consumirem.
Delegada do Sindicato Nacional dos Fiscais Federais Agropecuários (Anffa) no RS, Consuelo Garrastazu Paixão Côrtes cita a necessidade de repor funcionários. No país, existem em torno de cinco mil servidores. Desses, 500 atuam no RS.
O Mapa ficou 20 anos sem concurso público e, em função disso, o quadro envelheceu. “O último ocorreu 2012, quando foram nomeados 232 profissionais. O déficit em todo país chega a três mil fiscais, 150 só aqui no estado”, informa. Conforme o sindicato, 60% dos fiscais na ativa podem encaminhar a aposentadoria.
Segundo Consuelo, o déficit crescente de fiscais na ativa ameaça a vigilância sanitária nacional e põe em xeque a qualidade dos serviços prestados em centenas de indústrias. No entanto, acredita que a atitude dos fiscais envolvidos na fraude do leite e denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) em março passado por suposto recebimento de propina é isolada e não corresponde com o trabalho dos demais servidores.
No estado, dos 500 fiscais cadastrados pelo Mapa, 11 fiscalizam mais de 30 laticínios, 50 postos de resfriamento e 19 usinas de beneficiamento. No país, quase 200 profissionais se revezam para fiscalizar 1.480 estabelecimentos que industrializam leite.
Outro fator preocupante é a queda de 58,6% dos recursos do ministério para o pagamento de diárias aos servidores da Superintendência do Mapa no RS. De R$ 1,7 milhão, em 2010, caiu para R$ 722,8 mil, em 2014.
De acordo com a delegada sindical, é preciso trabalhar pelo fortalecimento da categoria, “que atua diariamente para garantir segurança e qualidade dos alimentos que chegam à população brasileira e que são exportados a diversos países.”
Projeto de terceirização
Tramita na Câmara dos Deputados um projeto para autorizar a fiscalização de produtos de origem animal vendidos no país. A intenção é repassar a responsabilidade para médicos-veterinários contratados e pagos pelas próprias empresas.
A Anffa é contrária à terceirização. Para a associação, o projeto desqualificaria o trabalho de fiscalização da categoria. “Não seria adequado o dono da empresa pagar seu próprio médico-veterinário, pois o empresário visa lucro. O fiscal não teria autonomia suficiente para fazer um bom trabalho e rejeitar um produto impróprio para o consumo.”
Esse modelo foi adotado em Santa Catarina e no Paraná. Para a delegada, mostrou-se ineficiente. Conforme a delegada, os países importadores não aceitam comprar os produtos fiscalizados sob esse regime. “Se eles não aceitam, por que aqui internamente nós precisamos comer qualquer coisa?”, questiona.
Como alternativa para melhorar o trabalho de fiscalização, Consuelo destaca a possibilidade de municípios ou o Estado contratar fiscais e esses terem o trabalho supervisionado pelo Mapa.
Ela critica ainda a nomeação de determinadas pessoas para ocupar a superintendência no Mapa do RS. “São trocas políticas que comprometem nosso trabalho. O ministério virou uma moeda de troca.”
Histórico da profissão
A carreira de “fiscal federal agropecuário” existe faz mais de 140 anos, mas só foi oficializada em 2000. Esse reconhecimento determinou que a categoria fosse formada por engenheiros agrônomos, médicos-veterinários, químicos, farmacêuticos e zootecnistas. Antes disso, as atividades de inspeção e fiscalização e controle da defesa agropecuária eram exercidas só por agrônomos e veterinários.
Os fiscais do Mapa também atuam nos campos, dentro de empresas do ramo, em laboratórios e programas agropecuários municipais, estaduais e federais. Por fim, atuam no exterior identificando mercados, divulgando produtos nacionais e intermediando políticas agrícolas. Hoje, há profissionais em Bruxelas, Buenos Aires, Genebra, Moscou, Pequim, Pretória, Tóquio e Washington.