FLÁVIO TAVARES | ZERO HORA | PÁGINA
NEGÓCIOS DA CHINA, POR FLÁVIO TAVARES*
Por que eles foram adiante e nós permanecemos estáticos, em berço esplêndido? pergunto-me, agora, ao observar em Brasília o primeiro-ministro da China, Li Keqiang, comprometendo-se a transferir ao Brasil bilionários empréstimos e financiamentos, além de ajuda tecnológica.
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Penso nos 53 bilhões de dólares oferecidos e recordo os três meses em que percorri a China em 1954. No quinto ano do triunfo da revolução comunista, os chineses viviam em pobreza digna. Sem máquinas, venciam a fome de séculos. Tudo era artesanal, mas todos trabalhavam. Homens e mulheres vestiam-se iguais, “elegantemente em azul”, sintetizava Vinícius de Moraes. Dois trajes ao ano, um de verão, um de inverno. Nas escolas e universidades, a não ostentação fazia crescer a ânsia de aprender e criar. Raros automóveis e milhões de bicicletas. Em Beijing e Xangai, os antigos marginais se reeducavam nas ruas, guiando bicicletas-táxi, derradeiro vestígio do país feudal.
No campo, vi milhares de homens e mulheres em fila passando milhões de regadores, um a outro, para irrigar cultivos com água do rio distante. Usavam a mão de obra abundante: eram 600 milhões.
Naquele 1954, ano do suicídio de Getúlio Vargas, éramos 59 milhões de brasileiros. Hoje, somos 200 milhões e eles quase 1 bi- lhão e 400 milhões. (Às 9h de 22/5/2015, o relógio populacional, em Beijing, media 1 bilhão 386 milhões 496 mil e 211 habitantes.)
A China tem terras pobres e desertos ventosos. Parte do país é área de terremotos. Nós temos terra fértil, grandes rios, florestas e rico subsolo. Nosso minério de ferro vai para a China, lá vira aço e volta com preço inferior ao do produzido aqui.
Em 1954, éramos mais “adiantados”, com carros e lojas elegantes. No inverno, até no Rio as mulheres vestiam casaco de pele. Com profundos contrastes, aqui começava o consumo, que se expandiu e chegou ao que hoje é. A China pobre pesquisava em busca de independência tecnológica. O governo nacionalizou as indústrias, mas deixou na direção os antigos proprietários. Depois, o rompimento com o comunismo russo isolou ainda mais a China, que se sobrepôs ao bloqueio militar e comercial dos EUA e chegou a caminhos próprios.
A cultura milenar os amparou. Do carrinho de mão à bomba-d’água, a vida moderna tem seus primórdios na China. A disciplina venceu e a pobreza virou riqueza.
Há 50 anos, nossas lojas já somavam 3 e 3 com máquinas registradoras. Na China, até hoje somam tudo no ábaco, em segundos, dedilhando bolinhas de um lado a outro, numa caixinha. Assim, se obrigam a raciocinar, não são robôs. E aí está a explicação das diferenças. Eles criam; nós copiamos.
Conto da China sem ser adepto do sistema político-econômico desse bizarro “comunismo capitalista”, viável na cultura de lá e inviável e absurdo entre nós. Mas lhes admiro a contração ao trabalho, a disciplina social, o combate ao crime e a honradez dos governantes. Isto fez da China uma potência.
Por isto, o coronel Vernon Walters, que organizou o golpe de Estado de 1964, afirmava ao governo do seu país que, a continuar a pregação de Brizola durante o governo João Goulart, o Brasil seria “uma China no continente”, junto aos narizes de Washington.
Em vez disso, sem capacidade de criar, hoje dependemos dos negócios da China rica.
P.S. – Em carta, a delegada sindical dos Fiscais Federais Agropecuários, Consuelo Paixão Cortes, assegura que, ao contrário do divulgado, nenhum fiscal integra o bando de adulteradores de leite desbaratado no Estado.
Por sua vez, o fiscal Carlos Soto Vidal esclarece que o fiscal preso e quatro inspetores sanitários afastados extorquiam indústrias sem ter vínculos com a quadrilha amparada por Francisco Signor, ex-superintendente do Ministério da Agricultura.
*Jornalista e escritor